Dentre as diversas formas utilizadas pelas empresas para se esquivar do pagamento de direitos trabalhistas, as que mais me tiram do sério são as que envolvem comissões.
O vendedor sai para trabalhar, faça chuva ou faça sol, e chega no final do mês e tem que brigar com o financeiro para tentar receber o que lhe é devido? Por favor!
Gostaria que você acompanhasse comigo o caso recente envolvendo a empresa Claro e um ex-funcionário, que atuava como vendedor externo. Tenho certeza que você vai se identificar.
João*, o vendedor que ingressou com a ação trabalhista e deu origem ao título desta matéria, na primeira reunião que tivemos, me contou que a empresa utilizava diversos pretextos para não pagar todos os valores devidos.
Em alguns meses, realizava pagamentos menores que o estabelecido no programa, mesmo com o atingimento das metas. Em outros períodos, não realizava o pagamento das comissões referente à venda de telefone e banda larga pois ele não havia atingido 60% das metas de TV.
Dito de outro modo, a companhia condicionava o recebimento de comissões de alguns produtos ao atingimento de metas de outros.
Ora, se o trabalhador é remunerado através de comissões sobre os produtos, não pode a empresa deixar de pagar comissões sobre as vendas de um produto X por ter o vendedor deixado de atingir a meta do produto Y!
João também me contou que não havia o pagamento de comissões sobre as vendas que ultrapassavam 160% do objetivo, e que os critérios eram frequentemente alterados dentro do mesmo mês, impossibilitando o atingimento da meta.
No dia da audiência, foram ouvidas testemunhas e foram analisados documentos, inclusive com a realização de perícia por contador especializado, o que levou o Juiz à conclusão de que realmente João estava falando a verdade.
Abaixo, é possível observar o trecho da sentença na qual o Juízo analisa esses pontos:
Dito de outro modo: as regras eram criadas exatamente para que o comissionamento pago fosse sempre o menor possível, contudo de modo que não impactasse nas vendas da empresa.
Com isso, a empresa foi condenada a pagar as diferenças de comissões devidas, pois não é permitido remunerar apenas parte do trabalho, nem estabelecer critérios que tenham por objetivo impedir o pagamento das comissões, ainda que em parte.
Veja abaixo mais trechos da sentença do Magistrado:
João também reclamou no pagamento de horas extras, pois sua jornada de trabalho começava às 8h e finalizava às 19h, ultrapassando o limite legal de 8h diárias.
Alegou que o fato de trabalhar de forma externa não significava que a empresa não pudesse saber os horários trabalhados, já que controlava através de aplicativos, Whatsapp e ligações, por exemplo.
A empresa, por outro lado, se defendeu alegando que não tinha possibilidade nenhuma de controlar a jornada do empregado, já que seu trabalho era exercido de forma externa, ou seja, na rua e nos domicílios dos clientes. Dessa forma, se o Juiz acolhesse essa alegação, a empresa não precisaria pagar as horas extraordinárias.
No trecho a seguir é possível conferir o entendimento do Juiz a este respeito:
No fim, não apenas era possível o acompanhamento da jornada, como a prova ainda demonstrou que a Claro efetivamente controlava a jornada do funcionário por diversos meios, tais como: aplicativo, através do acompanhamento do supervisor, com o estabelecimento de rotas a serem cumpridas, de relatórios e até mesmo por meio de grupos de WhatsApp.
Com isso, além das diferenças de comissões, a empresa foi condenada a pagar as horas extras excedentes da 8ª diária e também o tempo restante para completar 1 hora nos dias em que o empregado não tinha usufruído por completo de seu intervalo para almoço.
*João é nome fictício para manter o anonimato
0 Comentários
Faça um comentário construtivo para esse documento.